Quando o Clique Vale Mais que o AR: A Notificação por E-mail na Alienação Fiduciária Segundo o STJ
Você pode estar em meio ao escritório, com dezenas de contratos na mesa, e ali, entre cláusulas padronizadas e termos jurídicos, surge a velha dúvida: a notificação extrajudicial por e-mail vale ou não vale? Parece detalhe técnico, daqueles que se resolvem com uma olhada rápida no decreto-lei e pronto. Mas não é. É, na verdade, o tipo de questão que pode definir o rumo de uma ação de busca e apreensão — e, por extensão, de uma política inteira de recuperação de crédito. O STJ disse que vale. Sim, a decisão veio como um sopro de alívio para quem está do lado de cá do balcão — o credor. Na ação envolvendo a Aymoré Crédito, ficou claro: o e-mail registrado, enviado ao endereço eletrônico indicado no contrato, é sim capaz de constituir o devedor em mora. E mais: não precisa do tal do aviso de recebimento dos Correios. O “poderá” que aparece no art. 2º, §2º, do Decreto-Lei 911/69 não é à toa. Ele é um convite à modernidade, uma brecha legítima para que o Direito se reencontre com a tecnologia. E, vamos ser sinceros, o AR já estava pedindo aposentadoria há tempos. O detalhe que muita gente ignora é que a tecnologia já está fazendo parte do processo judicial faz tempo. O CNJ já admitiu o WhatsApp para intimações. O legislador já disse, na Lei 14.195/2021, que a citação eletrônica é preferencial. Se até o ato inaugural do contraditório pode ser digital, por que não a notificação extrajudicial do inadimplemento? É como disse o Ministro relator: se há previsão contratual e prova do envio, por que insistir na carta de papel, quando já se tem a certeza do clique, da entrega e até da leitura? E se ainda restava alguma dúvida, ela desaparece na cláusula contratual padrão que permite ao banco comunicar-se com o cliente por e-mail, SMS e o que mais a tecnologia inventar. Não é cláusula obscura. Está lá, na CCB, assinada com todas as letras. E mesmo quando o devedor diz que não reconhece o IP do computador que abriu o e-mail, a resposta já está pronta: quem hoje não acessa a própria caixa de entrada do celular, do tablet, da Smart TV? A senha é sua, o endereço eletrônico é seu, a notificação chegou — e isso basta. Essa decisão, se lida com atenção, é mais do que um precedente. É um roteiro. Um roteiro que orienta a atuação dos departamentos jurídicos das instituições financeiras em todo o Brasil. Um roteiro para redigir cláusulas com mais precisão, para documentar o envio com mais rigor, para operar com mais celeridade. E, sobretudo, um roteiro que dá respaldo ao processo de retomada de bens, com menos burocracia e mais segurança. Então, da próxima vez que alguém questionar a validade de uma notificação eletrônica, lembre-se: não é só válida. É eficiente, moderna e, agora, chancelada pelo STJ. E no mundo das garantias reais, onde o tempo corre contra o credor, isso não é pouco. É quase tudo. Dr. André Ribeiro, sócio fundador da MARADVOCACIA, pós graduado em Direito Empresarial pela UFMT, conselheiro estadual gestão 2025-2027, Presidente da Comissão […]
Read moreTema Repetitivo 1132/STJ: Segurança Jurídica Reafirmada ao Credor Fiduciário
A recente decisão proferida pelo Superior Tribunal de Justiça, no Recurso Especial n.º 2123288/SP, representa significativo reforço à segurança jurídica das operações de crédito garantidas por alienação fiduciária. Ao dar provimento ao recurso interposto por instituição financeira, a Corte reafirmou a tese já fixada sob o rito dos recursos repetitivos no Tema 1132, reconhecendo que, para fins de constituição em mora do devedor fiduciante, basta o envio de notificação extrajudicial ao endereço informado no contrato, independentemente da comprovação do efetivo recebimento. O caso em análise envolvia ação de busca e apreensão ajuizada pelo Banco Itaucard S.A., em virtude do inadimplemento de contrato de crédito bancário garantido por alienação fiduciária de bem móvel. O juízo de primeiro grau extinguiu o feito sem resolução do mérito, por entender que a ausência de comprovação da mora, diante da devolução da notificação com o registro “ausente”, inviabilizaria o processamento da demanda. Tal entendimento foi mantido pelo Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo. No entanto, o STJ entendeu que a decisão contrariava o entendimento firmado no julgamento do Tema 1132, ocasião em que se fixou a seguinte tese: “Em ação de busca e apreensão fundada em contratos garantidos com alienação fiduciária, para a comprovação da mora, é suficiente o envio de notificação extrajudicial ao devedor no endereço indicado no instrumento contratual, dispensando-se a prova do recebimento, quer seja pelo próprio destinatário, quer por terceiros.” A ministra relatora, Nancy Andrighi, foi enfática ao assinalar que o envio da correspondência ao endereço pactuado contratualmente supre a exigência legal prevista no § 2º do art. 2º do Decreto-Lei n.º 911/1969, e que a devolução da notificação com indicações como “ausente”, “mudou-se” ou “endereço insuficiente” não afasta a validade da constituição em mora, tampouco impõe ao credor o ônus de garantir o recebimento da correspondência. Conforme destacou a decisão, “cumpre ao credor demonstrar tão somente o comprovante do envio da notificação com aviso de recebimento ao endereço do devedor indicado no contrato.” Essa interpretação preserva a integridade do negócio jurídico e impede que o devedor se utilize de expedientes meramente formais, ou mesmo do não recebimento intencional da notificação, como instrumento para obstruir o exercício do direito de retomada do bem. A exigência de comprovação do recebimento da notificação extrajudicial, além de carecer de respaldo legal, ensejaria insegurança jurídica e estimularia condutas de inadimplemento estratégico. Do ponto de vista prático, a decisão confere maior celeridade à tramitação da ação de busca e apreensão, reduz custos operacionais e reforça a previsibilidade dos resultados judiciais para os credores que atuam de forma diligente. Além disso, contribui para a desjudicialização de controvérsias, ao uniformizar o entendimento sobre a comprovação da mora e consolidar jurisprudência favorável à higidez das garantias fiduciárias. Em um cenário de aumento da inadimplência e necessidade de recuperação de ativos, a reafirmação da tese do Tema 1132/STJ é providencial para o fortalecimento da atividade de crédito. O reconhecimento da validade da notificação encaminhada ao endereço contratual, independentemente de seu recebimento, representa importante proteção à boa-fé objetiva, à função social dos contratos e à regularidade do mercado financeiro. Dr. André Ribeiro, sócio fundador da MARADVOCACIA, pós graduado em […]
Read moreNem Todo Empréstimo Bancário é Crédito Rural: Entenda Por Que Isso Importa
No universo das relações de crédito, é comum que produtores rurais, empresários ou cooperados se deparem com dificuldades para honrar compromissos financeiros. Nessas situações, muitos acreditam que, pelo simples fato de atuarem na atividade agropecuária, os contratos de financiamento firmados com bancos ou cooperativas devam ser automaticamente tratados como crédito rural. No entanto, essa confusão entre contratos de natureza bancária e operações típicas de crédito rural pode gerar efeitos jurídicos indesejados, especialmente quando se tenta suspender a cobrança ou impedir o leilão de bens dados em garantia. Para que uma operação financeira seja enquadrada como crédito rural, não basta que o contratante seja produtor ou que o valor tenha sido utilizado em atividade agrícola. É necessário que o contrato atenda a exigências formais específicas, previstas em normas como o Manual de Crédito Rural e em resoluções do Conselho Monetário Nacional. Entre essas exigências, destacam-se a vinculação dos recursos a programas governamentais, a fiscalização do uso do crédito e a indicação expressa, no contrato, de que se trata de operação rural. Quando o contrato firmado é uma Cédula de Crédito Bancário, regida pela Lei nº 10.931/2004, com recursos próprios da instituição financeira, sem destinação controlada ou cláusulas típicas do crédito rural, trata-se de um empréstimo de natureza bancária comum. Mesmo que o tomador seja produtor rural, essa operação não se submete às regras específicas da política agrícola. Consequentemente, não se aplicam, nesses casos, os mecanismos legais de prorrogação compulsória, reestruturação forçada ou renegociação automática por eventos climáticos ou de mercado, conforme estipula o Manual de Crédito Rural. É importante compreender que, no âmbito judicial, a revisão de cláusulas contratuais e a suspensão de medidas como o leilão de um imóvel dado em garantia dependem de prova robusta da existência de cláusulas abusivas ou da prática de condutas ilegais pela instituição credora. Alegações genéricas ou baseadas em documentos unilaterais não são suficientes para justificar medidas urgentes que interrompam a execução de um contrato válido. A jurisprudência dos tribunais superiores, inclusive o Superior Tribunal de Justiça, tem reiteradamente decidido que a simples propositura de ação revisional não impede a caracterização da inadimplência. Isso significa que, mesmo discutindo judicialmente o contrato, o devedor continua em mora até que fique comprovado judicialmente que há vício contratual relevante que justifique a suspensão da cobrança. Ainda assim, a boa-fé objetiva impõe ao devedor, no mínimo, o dever de depositar nos autos o valor que considera devido, se pretende evitar a continuidade de atos de cobrança ou a perda do bem. Outro equívoco comum diz respeito à tentativa de aplicar regras do crédito rural em contratos que, embora eventualmente relacionados a atividades do campo, não foram formalizados como tal. A tentativa de ampliar, por analogia, os benefícios legais do crédito rural para contratos bancários desafia o princípio da legalidade e compromete a segurança jurídica. Quando há inadimplência e o contrato está garantido por alienação fiduciária, como é comum nas Cédulas de Crédito Bancário, a legislação especifica acerca da alienação fiduciária é clara ao prever que o credor pode consolidar a propriedade do bem e promover o leilão, desde que obedecidos os procedimentos legais. Suspender essas medidas apenas com […]
Read moreA Extinção da Dívida após Leilões Frustrados: Um Marco de Segurança Jurídica nas Garantias Fiduciárias
Em recente decisão unânime, a Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (REsp 1.999.675/SP) reafirmou uma tese de suma relevância para o mercado de crédito garantido por alienação fiduciária de bens imóveis: a frustração dos dois primeiros leilões públicos acarreta a extinção automática da dívida, exonerando o credor fiduciário de qualquer obrigação residual frente ao devedor.
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